segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Capítulo 3 [2]

O miúdo estava sentado com o seu casacão no colo e sorria para ela. Não lhe devolveu o sorriso, porque já não sabia sorrir. Aproximou-se, olhou-o fixamente, e sentou-se na outra ponta do banco. Esperava que se assustasse e fugisse para as saias da mãe, mas ele continuou sentado, a sorrir-lhe…

Devia ter o espanto estampado na cara. Não estava habituada a que se aproximassem dela, e muito menos a que lhe sorrissem…

Depois de umas trocas de olhares, o miúdo falou:

- Olá.

Não lhe respondeu. Já não sabia falar.

- Como te chamas? Eu sou o Diogo.

Não conseguia descolar os lábios. Parecia que tinham sido cozidos a agulha. Permaneceu, assim, a olhá-lo embasbacada durante o que lhe pareceram horas.

- És esquisita, sabes? As pessoas adultas que eu conheço falam muito, mas tu não. Não gosto de quem fala muito. Gosto de ti.

- Ninguém gosta de mim.

- Afinal falas! Cheguei a pensar que eras muda. Assim ainda gosto mais de ti, porque sabes falar mas só falas quando é importante.

- Porque é que estás aqui?

- Vim brincar para o jardim e achei-te bonita. Gosto de falar com pessoas bonitas.

- Não tens medo?

- Medo? De quê?

- De mim.

- Porque é que havia de ter?

- Porque sou pobre.

O Diogo riu-se. Tinha um sorriso muito bonito, só agora reparava. Não devia ter mais do que seis anos.

- Vamos brincar?

- Eu não sei brincar.

- Não tens filhos?

- Já tive, mas já não vejo a minha filha há muitos anos.

- E não brincavas com ela?

- Não.

-Oh, porquê? Não gostavas dela?

- Gostava.

- Então porque é que não brincavas com ela?

Não respondeu. Olhou para os olhos do rapaz, não havia ponta de maldade naquelas perguntas.

- Vá, já chega de perguntas. Os teus pais já devem estar a ficar preocupados.

- Os meus pais estão muito ocupados, nem se lembram de mim.

Laura reconheceu aquele olhar. Era o olhar de Mariana, quando recusava as suas brincadeiras para trabalhar. Pela primeira vez, viu a tristeza a inundar aquela criança.

Diogo levantou-se de rompante. Aproximou-se, deu-lhe um beijo repenicado na bochecha:

- Gosto de ti.

E foi embora, numa corrida de criança.

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