segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Capítulo 5 [4]

Laura ouvia-o com a atenção que uma mãe dá a um filho. Estava com as lágrimas nos olhos. Mas estas não eram as mesmas lágrimas que tinha chorado na noite anterior ao seu primeiro encontro com o Diogo. Estas eram as melhores lágrimas que já tinha chorado.

Naquele rapaz tão pequenino e ao mesmo tempo tão sábio, via esperança. Depois de lhe ter devolvido a alegria de viver, aqui estava ele a tentar dar-lhe o sustento de que precisava para voltar a ser uma mulher normal, sem estar dependente de ninguém.

- Mas… neste estado? Como é que a tua mamã vai aceitar uma contabilista sem-abrigo?

O Diogo abriu aquele sorriso que gostava tanto de ver:

- Isso… não te preocupes.

Abriu a porta que dava para a casa-de-banho do quarto.

- Podes tomar banho aqui, se quiseres. Só tenho champô para crianças, mas para já deve servir… eu vou buscar umas roupas e venho já.

Saiu do quarto de rompante e deixou Laura sozinha, com a porta da casa de banho enorme aberta para ela.

Entrou devagar, como se de um palácio se tratasse. Era uma casa de banho com cores vivas, de criança, mas servia perfeitamente. Oh, servir. Na verdade, nunca tinha entrado numa casa de banho tão bonita e espaçosa.

Fechou a porta atrás de si e começou a tirar as roupas velhas que a cobriam. Já não se lembrava da última vez que tomara um banho completo, com direito a água quente e champô.

Habitualmente, lavava-se onde podia, no laguinho do jardim, nas velhas casas de banho municipais, nas pensões onde ficava de vez em quando.

Mas assim, já não se lembrava.

Olhou-se ao espelho. Tinha um aspecto miserável. Roupas rotas, cara suja, cabelo desgrenhado. Até os dentes, que sempre conservara tão limpos e brancos, tinham agora sujidade de semanas sem os lavar.

Entrou na banheira. Abriu a água quente e deixou-a ferver-lhe as costas cansadas. Olhou para o chão. A água que lhe escorria do corpo continha a sujidade da rua que já lhe estava entranhada. Fechou os olhos, e sentiu o conforto que já não conhecia.

Teve que passar o champô e o gel de banho cerca de três vezes, para se libertar de toda a sujidade que a cobria. Quando saiu da banheira, estava outra.

Em cima do balcão, duas toalhas lavadas, uma escova para o cabelo e uma escova dos dentes. O dentífrico estava dentro do copo ao lado da torneira.

Envolveu-se com a toalha grande, cobriu o cabelo com a mais pequena.

Esfregou os dentes entusiasmada. Sentia-se fresca, leve. A tarefa deve ter demorado uns dez minutos, porque no fim a escova parecia velha e os dentes brilhavam.

O Diogo esperava-a no quarto. Em cima da cama, uma camisa branca, umas calças de ganga confortáveis e uns sapatos bonitos. Tudo novo.

- Isto é tudo para mim?

- Claro.

- Mas… onde é que tu foste arranjar roupa nova assim tão rapidamente?

- A minha mamã diz que não tem tempo para ir às compras e compra tudo por telefone, vê numa revista e depois encomenda… e há muitas coisas que ela ainda não usou, ainda nem lhes tirou a etiqueta! Acho que às vezes até se esquece que as tem.

- E ela não vai dar pela falta disto tudo?

Uma gargalhada.

- Não te preocupes.


Uns momentos depois, estava pronta. Olhou-se ao espelho. Era outra pessoa. Com roupas elegantes e confortáveis, mesmo à sua medida (a mãe do Diogo devia alimentar-se também a migalhas de pão), sentia-se nova.

Sabia que não era só a roupa que lhe dava o ar jovem que agora descobria no espelho. Não, isso era outra coisa. Mas, de uma forma ou de outra, sentia-se em si mesma, e essa era uma sensação muito boa.

O Diogo bateu à porta, entrou novamente e, lá em baixo, ouviu-se o rodar da chave. A mamã. Chegava a hora.

Era, ou assim esperava, o começo de uma nova vida.

Um comentário:

Sol da manhã disse...

Ai... ai!!!

À VIDA! Que coisa mais bonita......

À VIDA!!!!!

Um beijinho muito grande!!

SHALOM